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sábado, outubro 29, 2005

Será apenas uma questão de complexidade da ortografia?

A ortografia foi, e ainda hoje é, motivo de preocupação desde os primeiros gramáticos. Segundo João de Barros, autor da primeira gramática da língua portuguesa (1540), para os latinos a ortografia constituía uma das quatro partes da gramática. Nos séculos XVII e XVIII continua a ocupar um lugar de grande importância nos estudos gramaticais. Durante o século XIX aviva-se a discussão sobre alternativas à escrita tradicional e surgem, então, as primeiras disputas sobre acordos e desacordos ortográficos.

Hoje em dia, em pleno século XXI, e remetendo-me ilustrativamente ao post anterior, são ainda constantes as dúvidas e confusões ao nível da ortografia, entre escrita e pronúncia, no seio dos falantes do Português. Somos confrontados diariamente com estas incertezas e erros ortográficos, como por exemplo na publicidade, nos jornais e revistas, na Internet, ou em coisas tão banais como ementas de restaurante.

Uma questão se levanta: Serão estas confusões apenas uma questão de complexidade da ortografia do Português como vulgarmente se afirma?

De facto, a ortografia portuguesa, não sendo inteiramente fonética, ou seja baseada na pronúncia (cf. erros na parte direita da imagem da ementa), mas sim etimológica, isto é tendo por base os étimos latinos que estão na origem de grande parte do vocabulário português, apresenta um certo grau de dificuldade. Vejamos por exemplo o som [s] que pode ser realizado por quatro variantes gráficas distintas:

  • “s”: em início de palavra ou no meio de palavra quando precedido de consoante (logo “conservatória” e não “concervatória”);
  • “ss”: entre vogais (logo “responsável” e nao “responssável”);
  • “c”: quando antes de e e i (logo “aniversário” e não “anivercario”);
  • “ç”: no meio de palavras antes de a, o ou u.

No entanto, as incertezas e confusões ortográficas, na minha opinião, não são apenas o resultado da complexidade ortográfica do Português. Estas são, infelizmente, o reflexo de um fenómeno social bem mais complexo e grave – o problema da literacia em Portugal. A este associa-se um outro – a fraca tradição da leitura e cultura do livro, muito ao contrário do que acontece nos países da Europa central e do norte. Intimamente relacionada com estes dois aspectos está a questão da didáctica e ensino do Português.

Dever-se-á futuramente procurar as causas das incongruências ortográficas na sua fonte e não na superficialidade dos factos, assumindo para isso uma atitude de consciencialização e, simultaneamente, intervenção social. Não devemos fechar os olhos e ver nos erros apenas a vertente lúdica, rindo e ironizando, mas sim utilizá-la positivamente como forma de “combate”.

Tendo em mente as necessidades primordiais da situação actual, torna-se imperioso apelar ao conhecimento e à ajuda dos linguistas no sentido de se tomar medidas a nível local, regional e nacional de combate à literacia. Por outro lado, dever-se-á incentivar o gosto pela leitura e o cultivo do livro como fonte de entretenimento e não de apatia (aqui as bibliotecas desempenham um papel primordial). Por fim, e para abordar apenas os três aspectos centrais supracitados, dever-se-á alertar professores e responsáveis pelo ensino do Português para a necessidade de abandonar a atitude conservadora e até mesmo retrógrada nas técnicas e métodos de ensino do Português e incentivar o acompanhamento e evolução das técnicas e tecnologias tornando a aula moderna, inovadora e atractiva, cativando e não amedrontando e dispersando a atenção dos que aprendem a nossa língua - que tal começar por discutir e debater os erros não apontando o dedo discriminatório e de recriminação mas servindo-se da sua vertente humorística?