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sábado, fevereiro 25, 2006

Linguagem dos Jovens / Chatês: Consequências

Partido dos temas discutidos nos posts anteriores e se lhes acrescentarmos a produção de SMS como forma de comunicação, uma questão se impõe: que consequências poderão ter estas linguagens ou formas de comunicação na utilização da língua padrão? Provocarão um agravamento das capacidades de escrita ou até mesmo a decadência da cultura linguística como afirmam alguns puristas?

No Brasil foi elaborado um estudo para tentar responder a esta questão. No grupo de jovens testado constatou-se que os problemas na escrita não estavam relacionados com a utilização da linguagem dos jovens e do chatês mas sim com um método de ensino anti-autoritário utilizado nos anos 8O do sec. XX. A ideia central deste método era evitar a correcção dos erros nos textos dos alunos com o objectivo de não travar a criatividade na escrita. Além disso, verificou-se também que com o avançar da idade e a mudança a nível sócio-económico os jovens vão adaptando continuamente a sua linguagem à língua padrão, afastando-se cada vez mais da linguagem dos jovens.

O importante será primeiro consciencializar os alunos para o facto de que o chatês, o “smsês” e a linguagem dos jovens são variedades da língua com contextos de aplicação próprios, regidos pelas respectivas “regras”, e não adoptar uma atitude negativa perante as variedades em causa; segundo, saber distinguir os contextos em que se pode e deve usar uma determinada variedade ou a língua padrão – isso o grupo de alunos testado provou ser capaz.

Texto de Regina Danner (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 30.01.06. Para mais informações consultar seminário - 30.01.06 em
portuguesfalado.com.sapo.pt)

quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Chatês: alguns exemplos

ele – vens ter cmg hj?
ela – s
ele – vamos dar 1?
ela – hj n me aptc dar 1 ctg!
ele – pq? lol...
ela – pq es 1 fdp
ele – snsbsdb
ela – rotfl
ele – brb! vou fumar 1
ela – tb vou. afk
ele – back!
ela – back!
ele – tão? vens?
ela – vou sair agr
ele – bjo *
ela – te ja * afk

====Legenda====

PQP = Puta que pariu
LOL = Laughing Out Loud
ROTFL = Rolling On The Floor Laughing
RS = Risos
VTNC = Vai Tomar No Cu
SNBSDB = Se Não Sabes Brincar Sai Da Brincadeira
N = Nao
S = Sim
Yup = Sim
AFK = Away From Keyboard
BRB = Be Right Back
BLZ? = Beleza? (expressão brasileira)
CTG = Contigo
CMG = Comigo
QQ = Qualquer
PQ? = Porque?
APTC = Apetece
FDP = Filho Da Puta
TB = Também

In:
http://otugga.blogspot.com/2005_06_01_otugga_archive.html

O “chatês”

O termo “chatês“, formado à semelhança de português ou francês, é utilizado para designar a linguagem usada nos chats (conversações virtuais). Os estudos neste domínio, que tanto interesse está a despertar na linguística, são reduzidos e os que existem relativamente ao português provém quase exclusivamente do Brasil. No entanto, esta nova realidade linguística, criada como consequência da constante evolução tecnológica, está a tomar grandes proporções, abrangendo diferentes níveis da sociedade, e apresenta um desenvolvimento e características interessantes que merecem uma maior análise e atenção dos linguistas.

Numa perspectiva conceptual, o “chatês” enquadra-se na categoria do falado (tendo em conta o continuum falado/escrito) e permite, através da escrita, uma comunicação (quase-) simultânea, directa e contextualizada, que se caracteriza por uma grande rapidez na realização, à semelhança da espontaneidade da língua falada. Os “falantes de chatês” encontram-se numa sala de comunicação virtual, conhecida por chatroom, que permite até a participação em vários “ramos” conversacionais ao mesmo tempo. A sequência das informações digitadas é controlada de forma técnica. Aquele que primeiro digita a informação, aparece também em primeiro no ecrã. A possibilidade de comunicação directa e simultânea só é garantida se os participantes estiverem ao mesmo tempo no computador.

No que se refere às características do “chatês” verifica-se uma forte tendência para a utilização de expressões simples, curtas e de carácter informal. Denota-se também a preferência por construções paratácticas, com frases pouco estruturadas e sem limites claros, o que se justifica pelo curto prazo de planificação da informação transmitida. Tendo em conta o nível de experiência, tanto o receptor como o produtor estão sob uma espécie de pressão de tempo para poderem acompanhar o desenvolvimento da conversação, isto porque em muitos chatrooms, com o acumular das informações digitadas, estas desaparecem do ecrã rapidamente.

Texto de Regina Danner (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 30.01.06. Para mais informações consultar seminário - 30.01.06 em portuguesfalado.com.sapo.pt)

segunda-feira, fevereiro 20, 2006

A linguagem dos jovens: alguns exemplos

Jovem não briga ...................................dá porrada, anda ao selo

Jovem não vai a festa............................vai pra balada, vai pr' à borga

Jovem não tem pais...............................tem cotas, tem velhos

Jovem não faz amor .............................transa, dá uma, dá uma queca/um pinanço

Jovem não gosta muito.........................gosta bué

Jovem não está bom.............................está fixe, está altamente

Jovem não vai embora .........................baza

Jovem não urina....................................mija

Jovem não bebe.....................................chapa o coco

Jovem não solta gases ..........................peida-se

Jovem não come ...................................engole

Jovem não namora............................... pega uns, anda com

Jovem não cai........................................capota

Jovem não entra ...................................invade

Jovem não pede ....................................impõe

Jovem não digita....................................tecla

Jovem não xinga....................................manda tomar/levar no cú

Jovem não se masturba ........................bate uma

Jovem não ouve música.........................curte um som

adaptado de: http://muri_fofis.bigblogger.com.br

Outro exemplo: um jogador de futebol tem de ter personalidade

domingo, fevereiro 19, 2006

Linguagem dos jovens

A linguagem dos jovens é uma variedade diastrática da língua que se manifesta em todos os domínios linguísticos, nomeadamente na morfologia, sintaxe, semântica, pragmática, formas rotinadas e convencionalizadas de carácter discursivo e textual, aspectos não-verbais da semiótica (gestos), assim como, com menor intensidade, na fonologia.
Apesar de inicialmente a linguagem dos jovens ter surgido na conversação entre jovens do sexo masculino, a contribuição feminina para o desenvolvimento desta variedade é cada vez maior. Este tipo de linguagem é apreendido pelos jovens conscientemente e é usado intencionalmente como meio de auto-identificação. A linguagem dos jovens não é uniforme e a prova está no facto de nela encontrarmos variações de carácter social e regional. Além disso, factores como sexo, nível de formação e base étnica contribuem para o surgimento de diferenças e, consequentemente, para a quebra da uniformidade.
Uma das características mais marcantes da linguagem dos jovens é a sua curta-duração, mais concretamente a sua inconstância, assim como a riqueza em anglicismos que são usados com grande frequência com o objectivo de preservar e cuidar a imagem ou apenas pela mera necessidade de designação de um realidade.
Processos linguísticos usados na criação da linguagem dos jovens em português

Os processos linguísticos que estão na base da criação da linguagem dos jovens abrangem essencialmente as áreas da morfologia, sintaxe e semântica. Antes de passar à enunciação e exemplificação dos processos nestas três áreas é interessante referir que muitas das expressões apresentadas nos exemplos já não são utilizadas nem na variante europeia nem brasileira do português, ou seja, do momento da documentação à respectiva publicação algumas expressões dos jovens caíram em desuso, o que mais uma vez comprova o carácter esporádico deste tipo de linguagem. Zimmermann (2004) apresenta mina, palavra formada por síncope a partir de menina, como um dos exemplos já em desuso.

a) Processos morfológicos:
  • sufixação: sanduiche > sand-uba "estudante de literatura"
  • prefixação: des-transar "terminar uma relação, abandonar o companheiro"
  • composição: quebra-galho "ajudante, meio de ajuda"
  • aférese: estou >
  • síncope: menina > mina
  • apócope: analfabeta > analfa
  • troca de sílabas: vamos > mova
  • reduplicação: gruda-gruda "melga"
  • acrónimos/siglas: cu-de-ferro > CDF "marrão"

b) Processos sintácticos:

  • pronominalização: segurar-se
  • adjectivo/substantivo > advérbio: gostar horrores "gostar muito"

c) Processos semânticos:

  • metáfora: dar um eject "terminar uma relação amorosa"
  • metonímia: animal "estudante de medicina veterinária"
  • empréstimos do inglês: estar crowd "estar com muita gente"
  • tradução de empréstimos: trip > viagem
  • expressões hiperbólicas: satisfeiticíssimo
  • tendências disfemísticas: foder-se "ter azar"
  • fraseologismos: dar um jump "dar um salto para a piscina"

Texto de Regina Danner (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 30.01.06. Para mais informações consultar seminário - 30.01.06 em portuguesfalado.com.sapo.pt)

sexta-feira, fevereiro 03, 2006

Partículas discursivas no Português: funções

Enquanto sinais organizacionais, as partículas são usadas para ordenar e “comandar” a evolução duma oração e podem ser divididas em sinais iniciais e sinais finais.

Exemplos:
- sinais iniciais: agora, ah, ai, assim, bem, bom, depois, e, então, mas, pois, portanto
- sinais finais: não, não é?, não é verdade?, não foi?

As partículas discursivas podem também ser utilizadas como sinais do contacto, sendo necessário fazer a distinção entre os sinais de contacto por parte do orador e por parte do falante:

  • Sinais de contacto por parte do falante:
    - expressões do tratamento: a Sra., o Sr., meu Amor, minha Filha
    - assentimento: certo?, está bem?, hm?, não é assim?, não é isso?, sabe?
    - partículas que verificam a compreensão: compreende?, faço-me compreender?, percebe?
    - partículas que provocam uma reação por parte do interlocutor: diga, então?, explica lá?, fale, faz favor
  • Sinais de contacto por parte do ouvinte:
    - assentimento: ah bom, ai, claro, de acordo, diga, é evidente, é verdade, está bem, exactamente, pois, sem dúvida, sim
    - recusa: mas ..., não/não ..., olhe que, ouça, peço(-lhe) desculpa, por favor, repare, se me dá licença
    - admiração: ai meu Deus, é pá, essa agora, hã?, oh
    - incompreensão: como?, o que é que você disse?, para o quê?
    - sinais de turn-taking: desculpe, espere aí, está bem mas, oiça, peço desculpa, permite

O preenchimento de pausas numa oração é uma outra função das partículas (agora, ai, bem bom, como se diz?, de facto, digamos, pois) assim como a correcção de erros formais (bem, bom, digamos, eh, enfim, ou melhor). Para além destas funções, as partículas são ainda usadas como sinais de imprecisão (fulano tal, não sei onde/quanto/quem/quê, ou assim, ou seja o que for, para isto e para aquilo, qualquer coisa assim) e com a função de interjeições (hã?, hm, meu Deus, oh, zzzz).
Enquanto interjeições, as partículas permitem uma espontaneidade máxima, o que coaduna perfeitamente com uma das principais características da língua falada; são aceitáveis apenas numa conversação entre interlocutores que partilham uma certa familiaridade e podem expressar convite, exigência e pergunta, assentimento, recusa e protesto, valorização positiva e negativa, indiferença, sentimentos como dor, indignação, decepção, surpresa, alegria, sensibilidades como dor, fadiga, frio, aversão, etc.

Texto de Tomasz Perz (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 23.01.06. Para mais informações consultar seminário - 23.01.06 em
portuguesfalado.com.sapo.pt)

quarta-feira, fevereiro 01, 2006

Partículas discursivas no Português: definição e tipos

1. Definição de partículas (segundo Schmidt-Radefeldt 1994: 200)

As partículas discursivas, com frequência tão elevada na língua falada, são expressões que, de uma forma geral, tanto revelam a atitude do falante como contribuem para a organização discursiva.
A nível morfosintáctico são lexemas invariáveis (indeclináveis), compostos por um número reduzido de sílabas; não são interrogáveis nem podem substituir outras unidades na frase e têm uma posição restrita na oração.
A nível semântico-pragmático o seu valor pode variar consoante a entonação da declaração; podem também ser excluídas da frase sem modificar fundamentalmente o valor de verdade (o significado denotativo) da mesma.

2. Tipos de partículas

a) As partículas modais têm como função semântico-pragmática exprimir uma reação subjectiva por parte do falante em relação ao assunto enunciado. Através deste tipo de partículas o orador pode receber, admitir e antecipar os objecções possíveis e factuais do seu interlocutor; pode também considerar as valorizações e as notas pressupostas. Estas partículas estão direccionadas para o ouvinte.
Exemplos: acaso, agora, afinal, bem, cá, e, então, é que, já, lá, mal, mas, não, pois, se calhar, sempre, também

b) As partículas de interacção especificam as atitudes do orador, estando também direccionadas para o ouvinte mas de forma ainda mais directa que as partículas modais.
Exemplos: olhe, achas que?, vê lá, não calculas, como sabe, não se esqueça de que

c) As partículas argumentativas marcam as unidades argumentativas da oração nas suas relações, são expressões explícitas do encadeamento lógico dos argumentos e não diferem das conjunções.
Exemplos:
- a propósito, aliás, também, igualmente - marcam um argumento adicional
- por isso, por este motivo, pois, já que - marcam uma relação justificada
- assim, ora, por conseguinte - marcam uma conclusão
- quando muito, se tanto, contudo, portanto - marcam uma concepção

d) As partículas da organização do texto, como o próprio nome indica são marcos na organização textual e podem dividir-se em:
  • partículas topográficas: agora, antes, depois, lá dentro, daí, em cima, primeiro, segundo, último
  • partículas relacionadas com a espontaneidade da língua falada: pois, bem, ora, pá

e) partículas de gradação
Exemplos:
apenas, só, somente, meramente, simplesmente, unicamente
ainda, além disso, também, outrossim, do mesmo modo, de modo igual, da mesma maneira
até, mesmo, o próprio, nem sequer
precisamente, justamente, sobretudo, antes de mais nada, especialmente, particularmente, pelo menos, ao menos

Texto de Tomasz Perz (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 23.01.06. Para mais informações consultar seminário - 23.01.06 em portuguesfalado.com.sapo.pt)

quinta-feira, janeiro 26, 2006

Léxico: Lexemas passe-partout, repetições, diminutivos

Na língua falada, neste caso no português falado, o falante lida normalmente de forma bastante económica com o vocabulário. Tanto a selecção sintagmática (construção sintáctica usada – predomínio de frases simples) como paradigmática (ao nível por exemplo do uso de sinónimos ou antónimos) é reduzida. Daí que a frequência de repetições seja uma constante nas conversações do dia-a-dia, assim como o uso de lexemas passe-partout. Os lexemas passe-partout são formas lexicais de significado bastante vasto, o que as torna aplicáveis a qualquer contexto e coadunam perfeitamente com o princípio de economia vocabular: coiso/coisa, isto, isso, aquilo, fulano, tipo, há, existe.
O uso de fraseologismos, formas rotinadas e convencionalmente fixadas, é também muito frequente na língua falada e vai ao encontro da economia de esforço quer cognitivo quer lexical: vamos lá ver uma coisa, dão pano para mangas, dar uma volta, ver com bons olhos, trocar as voltas.
O recurso a formas de localização contextual, local e temporal (deixis como aí, ali, lá, cá, aqui) é uma marca da língua falada e ao mesmo tempo uma necessidade da mesma pelo seu carácter dinâmico, temporário e fugaz. Por outro lado, o recurso a expressões impessoais do tipo diz-se, disseram-me, pressupõe que o ouvinte partilhe um conjunto de informações contextuais que, por isso mesmo, pode ser omitido aquando da conversação, o que deixa transparecer também a intimidade característica da língua falada.
Importa ainda referir que a língua falada é espontânea e muito emocional, o que se reflecte também no vocabulário, como por exemplo no uso de partículas discursivas (é pá desse não me lembro; pois! com barba também!), interjeições (ó menina, tá mas é calada; ai meu deus; ai é?), eufemismos (já está com um ordenadozinho jeitoso), disfemismos (é como este ano o ano é desgraçado; tenho horários beras), aumentativos (é uma ilha lindíssima; ela leu muitíssimo bem; comecei há pouquíssimo tempo) e diminutivos (já tá grandinho, com três aninhos, repara; ... e há e é bracinhos e pezinhos e...; ...coisa gordinha, anafadinha e tal).
[Exemplos retirados do Corpus de Referência do Português Contemporâneo e de Gesprochenes Portugiesisch de Maria de Fátima Viegas Brauer-Figueiredo].

Texto de Vera Ferreira (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 09.01.06. Para mais informações consultar seminário - 09.01.06 em
portuguesfalado.com.sapo.pt)