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terça-feira, novembro 29, 2005

Português Falado: Características gerais da língua falada

1. Emotividade
a) interjeições (ui, oi, ai)
b) elementos enfáticos (realmente)
c) diminutivos
d) sinais:

  • de organização do texto: iniciais (bem, olhe, então), finais (não é?, nao têm?, pá)
  • de contacto (pois, bastantes)
  • de reforço ou confirmação de uma declaração (claro, é verdade, evidentemente, de facto, sim senhor)
  • de apelo à atenção do interlocutor (oiça, ouve, ouça)

e) (...)

2. Espontaneidade
a) preenchimento de pausas (quer dizer, enfim)
b) uso de palavras “passe-partout” (coisa, coiso)
c) correcções (ter-se-á de que > de, de > dos, dos automóveis > dos acidentes)
d) anacolutos (quebras ou mudanças abruptas de construção sintáctica)
e) repetições
f) construções de ênfase:

  • “hanging topic”
  • frases clivadas (o que é triste é que...)

g) (...)

3. Diálogo frequente
4. Elementos de localização situacional: deixis (isto, isso, aí, ali, cá)

5. Morfosintaxe
a) Tempo-Aspecto-Modo

  • uso do presente do indicativo em vez do futuro
  • o condicional é substituído pelo pretérito imperfeito do indicativo

b) Pronomes

  • uso frequente dos pronomes pessoais eu, nós (característica relacionada com a presença constante de diálogo na língua falada)
  • utilização do substantivo “(a) gente” gramaticalizado como pronome pessoal de primeira pessoa do plural: “a gente” em vez de “nós

c) Falta de concordância, de género e número nos substantivos e de número nos verbos
d) Uso frequente de parataxe (coordenação) em detrimento de hipotaxe (subordinação)
e) (...)

[cf. exemplo retirado do Corpus de Referência do Português Contemporâneo]

Texto de Tomasz Perz (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 07.11.05. Para mais informações consultar seminário - 07.11.05 em
portuguesfalado.com.sapo.pt)

segunda-feira, novembro 28, 2005

Português Falado: "variante" e "variedade"

1. Os termos “variante” e “variedade”

O ser humano conceptualiza o mundo de modo subjectivo e tem as suas próprias ideias e sensações. A linguagem que usa, mais concretamente as construções linguísticas que usa para verbalizar a conceptualização que faz do mundo que o rodeia e dos estímulos que processa, é reflexo dessa mesma subjectividade e variedade individual, a que se dá o nome de “variante”.
Tendo em conta que o indivíduo é um ser social, inserido num determinado grupo, essa variante individual propaga-se continuamente, numa espécie de corrente indutiva, por um grupo social, grupo etário ou até mesmo uma região, formando as chamadas “variedades”. Essas variedades, ou alguns elementos que lhes são característicos, podem ganhar uma importância maior alastrando-se por toda a comunidade linguística em causa, acabando por ser aceites e por se impor no sistema da língua (cf. post anterior - Português Falado: A linguística das variantes, a forma oral e escrita, o sentido da língua oral) como norma (de realçar o papel dos meios de comunicação neste sentido). O que era inicialmente individual e marcado transforma-se em algo regular, aceite por todos como construção normal. Este é o processo necessário para a evolução da língua; são estas variações (variantes e variedades) que dão o impulso para essa evolução. Sem variação não haveria mudança linguística.
O sistema de uma língua, isto é, todas as construções que uma língua tem ao seu dispor, possibilita a existência de variações (a “selecção” virtual de determinadas construções do sistema em detrimento de outras, a nível regional, social, etário, profissional, individual ou estilístico) que condicionam a mudança da mesma. Sistema e variação mantêm entre si uma relação metonímica de todo-parte.

2. “Corrente de variedades” de Koch/Oesterreicher (1990)

[trd. Koch, Peter / Oesterreicher, Wulf 1990. Gesprochene Sprache in der Romania. Französisch, Italienisch, Spanisch. Tübingen: Niemeyer, p. 15 - Esquema original]

Este esquema, ao qual Koch/Oesterreicher chamam a “Varietätenkette” (“corrente de variedades”), representa o continuum entre proximidade/distância. Por um lado, a um nível universal, o esquema mostra-nos que entre proximidade e distância existem níveis intermédios e que não se trata de uma relação bipolar, de “ou X ou Y”. Existem estruturas mais ou menos marcadas pela proximidade e outras mais ou menos marcadas pela distância. Daí a utilização do termo “continuum”. Por outro, ao nível de uma língua concreta, isolada, o esquema mostra que as marcas diafásicas, diastráticas e diatópicas estão interligadas. Num determinado falante ou grupo de falantes as marcas diatópicas podem, tendo em conta a norma da comunidade linguística, estar associadas a determinados traços diastráticos, que por sua vez, a um nível mais abrangente ainda, podem vir a ser apenas indicadores de um determinado estilo na utilização da língua em causa. Por exemplo, o lexema “gajo” no português era inicialmente uma marca dialectal, do português algarvio, que se generalizou não só a todo o país mas a todos os grupos sociais, perdendo o seu carácter de forte proximidade e as marcas diatópicas a ele associadas, deixando transparecer apenas a escolha do falante pelo estilo menos formal. Desta forma, as marcas diatópicas de um falante podem ser caracterizadas como diastraticamente baixas (“baixo – diastrático”) e assim sucessivamente.
Koch/Oesterreicher salientam ainda que estamos perante uma “corrente” unidireccional; a evolução ocorre de baixo para cima (diatópico – diastrático – diafásico até chegar à norma da língua concreta) e não vice-versa.


Texto de Tomasz Perz (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 07.11.05. Para mais informações consultar seminário - 07.11.05 em portuguesfalado.com.sapo.pt)

domingo, novembro 27, 2005

Português Falado: A linguística das variantes, a forma oral e escrita, o sentido da língua oral

1. Língua falada e escrita; língua da “proximidade/intimidade” e da “distância”

língua falada (informal, “proximidade”) vs. língua escrita (formal, “distância”)



2. O modelo da língua histórica de Eugenio Coseriu

[trad. Coseriu, Eugenio1976. Das romanische Verbalsystem. Tübingen: G. Narr, p. 17-35 - Esquema original]

2.1. Sistema – Norma – Discurso

D = Discurso (utilização concreta de uma língua)
N = Norma (as realizações convencionais de uma língua aceites pela comunidade linguística)
S = Sistema (a língua no seu todo, inventário de todas as formas possíveis)

3. As teorias de Aristóteles e de Ferdinand de Saussure

Desde os primórdios da história da humanidade que o fenómeno “língua” (enquanto sistema virtual ou realização concreta) tem ocupado filósofos e teóricos. Aristóteles, por exemplo, ao abordar a questão da língua, distingue ergon ‘obra’, dynamis ‘dinamismo’ e energéia ‘energía’. Enquanto Dynamis representa a capacidade universal da linguagem, a “potência” da língua virtual ou, a nível individual, a língua que um indivíduo possui; Ergon é o produto em si, o resultado da utilização da língua (a totalidade dos “textos”, orais ou escritos). Energéia, por sua vez, é o termo que designa a actividade da fala, o discurso, o momento concreto de utilização da língua (a língua concreta).

Ferdinand de Saussure descreve a língua como um sistema das estruturas (“estruturalismo”). Diferencia entre langue ‘língua’ (sistema da língua, uma língua individual que pressupõe um desenvolvimento diacrónico, ou seja, surge da história) e parole ‘fala / discurso’ (o uso concreto da língua, quer na forma oral quer escrita).

Texto de Tomasz Perz (Protocolo do seminário "Português Falado", do dia 24.10.05.
Para mais informações consultar seminário - 24.10.05 em portuguesfalado.com.sapo.pt)

sexta-feira, novembro 11, 2005

“lavas-te” vs. “lavaste”

É frequente encontrar no português escrito uma certa confusão entre as formas verbais do tipo “lavas-te” e “lavaste”. Estas são, no entanto, duas formas distintas e com delimitações claras dos seus contextos de aplicação.

  1. “lavas-te” é a uma forma do verbo “lavar”, nomeadamente a segunda pessoa do singular do presente do indicativo; “te”, separado do verbo através de hífen, é um pronome pessoal clítico que, protopicamente, desempenha a função sintáctica de complemento directo (também chamado “objective”) nos verbos transitivos.
  2. “lavaste”corresponde à segunda pessoa do singular do pretérito perfeito do indicativo do verbo “lavar”. “te” faz parte da desinência da segunda pessoa do singular do pretérito perfeito (-ste), ou seja, é parte integrante da forma verbal e não pode ser separado da mesma.

Estratégia para distinguir as duas formas: Acentuação

  • “lavas-te”: o acento recai na antepenúltima sílaba (lá-)
    Se o acento recai na antepenúltima sílaba (“lavas-te” = “lávas-te”), estamos perante a forma verbal do presente do indicativo, logo “te”, não sendo parte integrante do verbo, deve ser separado do mesmo através de hífen.
  • “lavaste”: o acento recai na penúltima sílaba (-vás-)
    Se o acento recai na penúltima sílaba (“lavaste” = “laváste”), estamos perante o pretérito perfeito do indicativo, logo “te” não se separa do verbo.

Mais exemplos:
“pássas-te” vs. “passáste”; “identifícas-te” vs. “identificáste”

A mesma estratégia pode ser utilizada para distinguir formas do presente com pronome reflexo “se” (“fala-se”) de formas do pretérito imperfeito do conjuntivo (“falasse”). Tal como vimos nos exemplos anteriores, na forma com hífen (presente do indicativo com pronome reflexo “se”) o acento recai na antepenúltima sílaba (“fala-se” = “fála-se”); a forma sem hífen (primeira ou terceira pessoa do pretérito imperfeito do conjuntivo) é acentuada na penúltima sílaba (“falasse” = “falásse”).

Mais exemplos:
“láva-se” vs. “lavásse”; “pássa-se” vs. “passásse”

quarta-feira, novembro 02, 2005

“Há”, “à” ou “á”?


À tramoço e minuins... uma frase que prende a nossa atenção, não apenas pelos erros nos substantivos mas também por ser exemplificativa de uma das confusões frequentes no Português escrito: quando utilizar “à” ou “há”. Esta é sem dúvida uma incerteza presente no quotidiano de muitos falantes do Português. Todos nós já recebemos, por exemplo, um sms ou email com expressões como “à um ano”, ou lemos num chat ou artigo de blog algo como “à muito tempo”.

Para comprovar esta confusão com dados quantitativos e de forma rápida, decidi fazer uma pequena pesquisa no Google e constatei que expressões como “à muito tempo”, “à um tempo”, “à um ano” e até mesmo “há noite” têm, de facto, uma frequência de uso bastante elevada: 2470, 571, 383 e 679 ocorrências respectivamente. Perante estes dados, achei pertinente apresentar um pequeno esclarecimento relativo ao uso de “há” e “à” que espero venha a ajudar todos os que gostam da nossa língua e se interessam por ela.

Antes de mais, é importante referir que esta confusão se explica em parte pelo facto de se tratarem de duas palavras homófonas, ou seja duas palavras que apresentam o mesmo som quando pronunciadas mas que têm grafias e significados distintos, como iremos ver de seguida.

À” é o resultado da contracção da preposição “a” com o artigo definido no feminino singular “a” (a + a = à).
Exemplos:
O Paulo vai à biblioteca. = O Paulo vai a(prep.) a(art.) biblioteca.
Vou à praia. = Vou a(prep.) a(art.) praia

Relacionada com a forma “à” está também a incerteza na colocação do acento: grave (`) ou agudo (´)? Na minha pesquisa encontrei 2.410.000 ocorrências da preposição com acento agudo (“á”). No entanto, esta forma, além de incorrecta, não existe. Tratando-se da contracção da preposição “a” com o artigo definido feminino no singular ou plural, “a” / ”as”, como exemplificámos em cima, o acento é sempre grave (“à” / “às”). A forma “ás” (com acento agudo) existe mas nada tem a ver com a preposição em causa; “ás” é a designação de uma carta de jogar (por exemplo o “ás de copas”).
O acento grave só surge em mais cinco palavras portuguesas, nomeadamente as que envolvem a existência da preposição “a” e a sua contracção. A saber: “às” (a + as): “Ele foi para a escola às quatro horas.”; “àquele” (a + aquele): “Ele foi àquele sítio de que te falei.”; “àquela” (a + aquela): “A Carla foi àquela conferência.”; “àqueles” (a + aqueles): “Os meus primos foram àqueles bares famosos.”; “àquelas” (a + aquelas): “Elas foram àquelas lojas.”.

”, por seu lado, é uma forma do verbo “haver”, mais concretamente a terceira pessoa do singular do presente do indicativo. Este verbo, além de outras significações, é utilizado com o sentido de “existir” (e neste sentido não tem plural: “hoje há aula” / “hoje há aulas”). Com expressões temporais é sempre utilizado o verbo “haver”.
Exemplos:
Há tremoços e amendoins.
Há barulho na sala. (= existe barulho na sala)
Há muita gente na rua. (= existe muita gente na rua)
Ela festejou o aniversário há pouco tempo. (não “à pouco tempo”)
Há uma hora (atrás). (não “à uma hora atrás”)

Existem alguns testes que nos ajudam a confirmar a utilização correcta de “à” ou “há”, como por exemplo:
  • Alterar a expressão que vem a seguir a “à” por um sintagma nominal masculino e ver se é necessário mudar ou não “à” para “ao” (a + o). Se for necessário efectuar esta mudança, ou seja contraindo a preposição com outro artigo definido masculino, é sinal de que se trata da contracção da preposição com o artigo, logo dever-se-á escrever “à”; se a troca do substantivo não originar esta mudança, estamos perante um caso de utilização de “”:
    Exemplo:
    ir à/há praça > ir ao mercado/ir há mercado = ir à praça.
  • Se ao substituir “há” por outra forma verbal do mesmo verbo, por exemplo “houve” ou “havia”, ou pelo verbo “existir”, a frase mantiver o seu sentido, estamos perante a utilização correcta de “há”; se o sentido se perder dever-se-á usar “à”:
    Exemplos: Há/à aulas > houve aulas = aulas.
    Ele disse que há/à um acento na palavra > Ele disse que existe/havia um acento na palavra = Ele disse que um acento na palavra.
    Ele vai à/há escola > Ele vai existe escola (perde o sentido) = Ele vai à escola.

Tente agora ver se ainda tem dúvidas pondo os testes em prática na resolução deste pequeno exercício: http://www.eb1-penedos-altos.rcts.pt/4ano/completarcomhaa.htm